> Anos 70. Elvis e Priscila estão divorciados, o presidente é um canalha e as donas de casa conversam com plantas. Homens não gostam de ver mulheres em nenhum lugar com exceção da cozinha e abaixadas sobre os joelhos, quanto mais em um palco segurando guitarras. Em meio a um antro de homossexualidade, drogas e uma sociedade com a mentalidade de uma velha careta, Joan Jett resolve formar uma banda apenas de garotas para tocar Rock n´Roll.
> Ao som de Do you wanna touch me, de Gary Glitter, que não muitos anos depois seria regravado por Joan, a morena durona que ainda atendia pelo nome Larkin tropeça em Kim Fowley, um adestrador de bandas de corpo fechado, o mesmo cara que anos depois seria produtor de Helen Reddy, Alice Cooper e da banda Kiss. O Rei da Histeria é o sortudo que pôde ouvir pela primeira vez a promessa da banda The Runaways.
> O único trabalho de Floria Sigismondi como diretora é digno de elogios. O ambiente com palavrões e músicas da década de 70 criou o perfeito cenário para elevar as atuações de Dakota Fanning e Kristen Stewart ao limite. Desde Silêncio de Melinda não testemunhava um bom trabalho de Stewart, aprisionada em uma realidade de depressão e vampiros da saga Crepúsculo. Quanto a Dakota, não lhe havia sido apresentado nenhum papel de valor para que pudesse demonstrar tamanha graça quanto a que assistíamos quando ela ainda era uma criança.
> O filme não tem meias palavras. A cena de abertura é a primeira menstruação de Cherie ao som da letra depravada de Roxy Roller. Reclamando da vida, de seu corpo, das atitudes da irmã e da mãe consumista que não dá a mínima para as filhas. Ao contrário da garota insatisfeita, Joan Larkin é mais decidida, somos apresentados a uma morena de cabelo repicado escolhendo roupas na repartição masculina. Com alguns quilos de moedas ela compra sua primeira jaqueta de couro, e no decorrer da história podemos ouvir na trilha sonora as principais musicas da banda antes que fossem compostas.
> Tão logo Jett é apresentada à baterista Sandy West a banda se forma. Cherie entra, inicialmente, apenas como o rostinho bonito da banda, mas logo recebe o incentivo que precisava, incitada a cantar com a angústia de ter “pego a irmã transando com seu namorado na cama de sua mãe”, discurso de Fowley, um trabalho primoroso de Michael Shannon com seus discursos, roupas e maquiagens.
> A ideia não é o clichê de um sonho americano. Não é pelo dinheiro ou pelo sexo. São garotas de 15 e 16 anos fazendo rock. Reescrevendo a balada do diabo e tirando os garotos para dançar. Quando o sucesso chega e a turnê parte para o Japão, Cherie Currie, a vocalista loira interpretada por Dakota, já atende pelo nome de Cherry Bomb e entope o nariz de cocaína.
> O grande destaque vai para a recriação dos trabalhos nos palcos. A turnê pelo Japão rende uma nova versão de Cherrie Bomb explorada até os limites pela produção e interpretação de Dakota Fanning, a ousadia de cantar de lingerie frente a adolescentes e lares japoneses.
> O ponto baixo do filme fica em seu desfecho. Tão bem o filme decola, a ruína aparece. Os problemas internos da banda, que jamais foram escondidos da mídia, são tratados de maneira leviana, e quando chega o momento da separação, e todos sabíamos que chegaria, tudo ocorre muito rápido e o filme acaba. Talvez a participação de Joan Jeat na produção do filme e a falta de experiência da diretora de clipes musicais em trabalhar com cinema, tenham sido fatores que prejudicaram o desfecho de uma história primorosa.
> Assim, as garotas que poderiam ter dominado o mundo abandonam os palcos pelas mesmas razões que destroem qualquer banda de rock, o uso abusivo de drogas, o egocentrismo exacerbado, geralmente do vocalista, e os desentendimentos entre os membros da equipe. The Runaways sai de cena, mas deixa muito claro a quebra de paradigmas. Garotas podem sim, tocar guitarra elétrica.
Publicado na edição 069 do jornal Manchete do Vale de Itajaí em 18 de novembro de 2011
Ah que bom que você gostou. O filme não foi lá muito bem aceito pela crítica, mas eu gostei bastante. É um trabalho bem feito e que merece ser visto!
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